Cartas sempre fizeram parte da história política do Brasil.
Na República Velha, a carta que nunca foi escrita pelo candidato à presidência Artur Bernardes contra os militares e no Estado Novo, o Plano Cohen: a carta de “comunistas” que deporiam o governo Vargas, escrita pelo integralista e capitão Olímpio Mourão Filho, o mesmo do golpe de 1964!
A introdução se faz necessária porque preciso confessar que conheço o autor da carta promovida dia 17 de maio de 2019, por aquele que se diz Presidente.
No início da década de 2000, ensaiávamos em um estúdio em Copacabana, Rio de Janeiro ao lado de uma das mais significativas ruas da cidade, Prado Júnior, com “gente de bem” entre prostitutas, michês e viciados. O estúdio se localizava em um prédio pequeno com elevador claudicante, academia de artes marciais, igreja evangélica, costureiras e apartamentos para a prostituição.
O gerente da casa de prostituição, porta a porta com o estúdio, gostava da nossa banda Mustang e assistia aos nossos ensaios. Certa vez, de manhã, enquanto ensaiávamos, o gerente ficou esfregando um pênis de borracha na janela acústica do estúdio. O baterista, rindo sem parar, me chamou a atenção e eu fiquei de cara. Essa é a boa recordação daqueles tempos.
A má lembrança é que o irmão do dono do estúdio é o autor da carta divulgada por aquele que se diz Presidente em 17 de maio de 2019.
Escrita por um guitarrista de rock, o que me fez refletir, mais uma vez, sobre dissociação cognitiva e incompreensão da realidade. Naquela época, há 15 anos, ou mais, eu nunca desconfiaria que um músico de rock pudesse ser fascista, reaça ou de direita! Que ingênuo eu era… Uma carta que reflete e me relembra do pior do bairro de Copacabana, e o pior do Brasil. E o pior das pessoas.
Admiro a liberdade de Copacabana, para uns libertinagem, e nesse bairro, esbarrei com pessoas maravilhosas como Elke Maravilha, Leonel Brizola, Clóvis Bornay e Jane Di Castro.
Mas também presenciei muita coisa estranha na Princesinha do Mar… Recentemente, vi um arrastão testemunhado por policiais que nada fizeram (“não é problema nosso”) e li na imprensa sobre um lutador de academia que atirou em um morador de rua; sobre idosos que atearam fogo em outro mendigo; sobre idosas vendendo drogas em casa e uma tabacaria de rua que negociava drogas pra geral… Um espelho do Brasil.
A carta, e o que se diz Presidente, passarão. São lixo da história. Copacabana continuará entre plumas, paetês e balas perdidas – e encontradas.